Pelo
nosso Curso passaram 10 ex-alunos do Colégio Militar. Agora que está em curso
uma repentina e conturbada transformação do seu modelo educativo transcrevo o
significativo discurso do Comandante de Batalhão na abertura solene do ano
letivo.
Com
a devida vénia ao seu autor, o Nuno Raposo, que tem 7 anos de vivência colegial e representa
todos os seus camaradas!
“Devo confidenciar-vos que a minha alma é, neste momento,
invadida por um misto de sentimentos contraditórios. Por um lado, é a alegria e
o orgulho que me preenchem, por aqui estar, hoje, no comando do Batalhão
Colegial, a discursar para todos vós, nestes claustros centenários gastos pelo
tempo … mas por outro, é a tristeza e o receio que me assombram por saber que
estes claustros, que sobreviveram a invasões, a guerras civis e a golpes de
estado, estão frágeis e que podem sucumbir ao mais pequeno dos terramotos.
O Colégio encontra-se hoje na situação mais difícil da sua
longa e áurea história de 210 anos.
O Exmo MDN, Dr. José Pedro Aguiar Branco, destruiu, com a
tinta azul duma caneta no seu luxuoso gabinete aquilo que, durante mais de dois
séculos, milhares de portugueses construíram com o vermelho do sangue nas mais
adversas condições.
Alegando, inicialmente, razões económicas e mais tarde,
razões de caracter ideológico, o Exmo MDN pôs fim a dois séculos de ensino de
excelência, pôs fim a dois séculos da História do nosso Portugal, pôs fim ao
sonho do Homem que de simples soldado se fez Marechal e a Ministro da Guerra,
cargo que ocupou não pelos jogos políticos mas pela riqueza de caracter e
extraordinário carisma demonstrados no comando dos seus homens.
O despacho de Abril veio pôr fim ao Colégio que todos
conhecíamos e dar início a um outro, muito diferente, cheio de novos problemas,
cheio de novos desafios e, acima de tudo, cheio de novas oportunidades.
A responsabilidade de manter a chama viva e de construir o
futuro desta casa recai sobre todos nós… Uns por cá estudarem, outros por cá
terem estudado, uns por cá trabalharem, outros por terem confiado ao Colégio a
educação dos seus filhos … e é por isso que só em conjunto e reforço, só em
conjunto seremos capazes de ultrapassar os obstáculos que se adivinham, de
forma que peço a todos e a cada um de vós que vos entregueis de corpo e alma a
esta nossa Casa que tanto nos ensinou para que possa continuar a transmitir às
gerações futuras os valores idealizados pelo Fundador e inscritos no nosso Código
de Honra.
Pais e encarregados de educação, quero aproveitar este
momento solene para agradecer a confiança que depositastes no Colégio Militar
ao escolherdes este projecto educativo para a educação dos vossos filhos. Quero
pedir-vos que apoiem e ajudem os vossos filhos com todas as vossas forças, que
falem com eles sobre os assuntos que os preocupam e incomodam e que não
desistam de lutar por eles mesmo quando eles desistirem de si próprios porque a
família é uma unidade fundamental na educação das crianças e dos jovens e sem o
vosso apoio, a educação deles fica comprometida.
Professores, da vossa parte esperamos total disponibilidade e
máximo empenho porque sois um pilar fundamental na aprendizagem dos nossos
alunos. Um bom professor não é aquele que se alheia das suas responsabilidades
e permite aos alunos que tudo seja feito, só para cair nas boas graças destes.
Um bom professor é aquele que exige o máximo dos seus alunos e não permite
falhas por desleixo, mesmo que isso lhe custe uma reputação menos boa perante
os discípulos. Empenho e dedicação é tudo o que vos peço porque esta casa
também é vossa e cabe-nos a todos trabalhar por ela.
Por último dirijo-me a vós alunos, na qualidade de Comandante
de Batalhão e de irmão mais velho. O Colégio tem uma história invejável, com 5
presidentes da república, inúmeros ministros, atletas olímpicos e figuras de
relevo na sociedade mas não podemos viver encostados à História nem às figuras
ilustres do passado porque o Colégio, muito mais que o passado, é o presente e
o futuro.
Nós somos a razão de ser desta Casa e não temos estado à
altura das circunstâncias. Os resultados escolares dos últimos anos não são
admissíveis numa escola que se diz de excelência. É tempo de inverter a postura
de ociosidade que se tem vindo a generalizar nos últimos anos e de nos
aplicarmos a fundo nos estudos e nos resultados, já que eles são, para a
sociedade, o espelho desta Casa e deles depende muito a entrada de novos
alunos.
A falta de alunos é um dos principais problemas com que o Colégio
se debate, de forma que não nos podemos dar ao luxo de abandonar os mais
fracos. Bem pelo contrário, temos o dever de os aceitar na diferença, de os
proteger e de os integrar porque ou vencemos como um todo ou morremos como
indivíduos.
“Neste Colégio, ninguém fica para trás”, disse-o o presidente
da AAACM no 3 de Março último e reforço-o eu aqui, porque acredito ser algo que
todos temos de interiorizar.
Graduados, este será certamente um ano que nenhum de nós
esquecerá. A responsabilidade que recai sobre nós por termos sob nossa alçada a
orientação dos mais novos, é enorme. O ano lectivo que hoje oficialmente se
inicia reserva-nos certamente inúmeras adversidades, muitas delas relacionadas
com o próprio processo de reforma, mas estou certo de que se conseguirmos
conservar o bom senso e agirmos sempre de acordo com os princípios do Código de
Honra, seremos capazes de ultrapassar todo e qualquer obstáculo que se
atravesse no nosso caminho.
Futuros Ratas, reservei para vós uma mensagem muito especial que
espero que guardeis na memória como a primeira e uma das mais importantes. É
com muita alegria que vos vejo aqui hoje formados no centro das atenções,
envergando pela primeira vez a farda cor de pinhão. Inicia hoje, aqui, debaixo
de todos estes olhares, o vosso longo percurso de 8 anos que fará de vós homens
e mulheres prontas a servir Portugal. Prometo-vos que o caminho vai ser
difícil, se fosse fácil qualquer um o faria, cheio de obstáculos e provações
que só em conjunto sereis capazes de ultrapassar. Os camaradas que dormem ao
vosso lado serão os vossos melhores amigos, não só aqui, durante estes 8 anos,
como também depois, quando terminar o vosso percurso. São eles que vão estar
presentes nos momentos de maior felicidade e vão ser eles também a dar-vos a
mão nos momentos de sofrimento e de tristeza. Hoje, turistas, provavelmente não
sereis capazes de entender a profundidade destas palavras mas amanhã,
finalistas, compreendereis certamente a emoção nelas contida.
Termino da mesma forma que, em Janeiro de 1961, John F.
Kennedy terminou o seu discurso de tomada de posse, dizendo-vos não para
perguntardes o que o Colégio pode fazer por vós mas o que podeis vós fazer pelo
Colégio.
Bem hajam"
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