sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

NOTA NECROLÓGICA


Por não ter sido possível  publicar na altura do seu falecimento apresentamos agora a nota fúnebre.

CFR FRANCISCO JOSÉ COSTA PEREIRA



O Capitão-de-Fragata (Ref) Francisco José Costa Pereira faleceu em 3 de Maio de 2016, na sequência de doença invulgar e inesperada.
Nasceu em Portagem, concelho de Marvão, a 10 de Julho de 1946. Depois de frequentar localmente a instrução primária, ingressou em 1957 no Instituto dos Pupilos do Exército (IPE) tendo frequentado a vertente industrial do ensino aí ministrado, designadamente o curso médio de Electrotecnia e Máquinas. Em Setembro de 1964 ingressou na Escola Naval, classe de Engenheiro Maquinistas Navais (EMQ), integrando o curso “Hermenegildo Capelo”. Para além de bom aproveitamento escolar e académico, salientou-se no IPE como ginasta, integrando a respectiva classe especial de ginástica que nessa época tinha assinalável reputação, inclusivamente com actuações no estrangeiro. Na Escola Naval, a prática da vela despertou o seu interesse. No futebol, o seu apelido, homónimo de um famoso guarda-redes da época, ditou a sua posição nos jogos onde participava.
Foi promovido a guarda-marinha EMQ em 11 de Janeiro de 1968. Desempenhou funções a bordo de diversos navios, designadamente nos Patrulhas da classe Maio, NE Sagres e Fragatas da classe Alm. Pereira da Silva. Esteve em comissão em Moçambique, embarcado no Navio de Apoio Sam Brás em 1974/5.
Das comissões de serviço em organismos em terra, é de salientar a permanência de cerca de 6 anos e meio no Arsenal do Alfeite e, posteriormente, de 3 anos e meio na Escola de Máquinas, na qualidade de Director. No Arsenal, além de funções na Divisão de Mecânica, foi seguidamente assessor do Administrador, realizando estudos de reorganização da produção e integrando o grupo de oficiais da Armada na altura em serviço no organismo, que elaboraram os planos de formação em gestão para chefias directas e cargos afins, iniciativa que trouxe grandes benefícios ao funcionamento do estaleiro. Na sua acção enquanto Director da Escola de Máquinas, imprimiu uma nova dinâmica na gestão dos formadores, nomeadamente dos sargentos, com assinaláveis benefícios para melhoria da aprendizagem.
No âmbito militar foram-lhe atribuídos sete louvores individuais e foram-lhe concedidas as medalhas da Cruz Naval – 2ª classe, Mérito Militar – 2ª Classe e de Comportamento Exemplar de Prata.
Entretanto, na condição de “trabalhador- estudante”, licenciou-se em Psicologia Clínica no ISPA e concluiu o mestrado em Comportamento Organizacional no mesmo Instituto. Decidiu pôr termo à carreira no serviço activo da Marinha, tendo passado à situação de Reserva no posto de CFR em 1 de Outubro de 1991.
Dando sequência ao interesse pelas matérias das ciências da comunicação como campo aplicado da psicologia organizacional, começou por integrar projectos de consultadoria e formação nas áreas de gestão, comunicação e comportamento organizacional, e foi convidado a leccionar Psicologia da Publicidade, Comportamento do Consumidor e outras unidades curriculares da área comportamental e organizacional na Escola Superior de Comunicação Social do Instituto Politécnico de Lisboa (ESCS/IPL).
Deu assim início a uma segunda “carreira profissional” como docente do ensino superior e investigador, tendo obtido o doutoramento em Sociologia, na Universidade de Provence em 1999, a que acrescentou o doutoramento em Psicologia Organizacional pelo ISCTE. Contudo, manteve ligação à Marinha através da docência no Instituto Superior Naval de Guerra durante cerca de 18 anos, até atingir a reforma. Mais tarde exerceu a docência no Instituto Superior de Estudos Militares (IESM). Depois de reformado no sistema público em 2010, continuou a ligação ao ensino e à investigação como Professor Associado, na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Foi professor visitante da Universidade Complutense de Madrid.
Na carreira académica, além do ensino, evidenciou um grande dinamismo quer em investigação quer no associativismo científico, sendo muito considerado pelos alunos e reconhecido pelos pares. Aprofundou a área da comunicação estratégica e foi coordenador do Observatório da Publicidade entre 2001 e 2010, onde desenvolveu actividade de investigação nos vários domínios da publicidade. Foi autor e co-autor de diversos livros de especialidade e de dezenas de artigos científicos. É co-autor do Caderno Naval nº 37 (Abril-Junho de 2011), editado pelo Grupo de Estudos e Reflexão Estratégica da Marinha, com o trabalho “Contributos para a Liderança Militar na Marinha de Guerra Portuguesa”.
Quer na carreira militar quer na sequência académica, manteve sempre o perfil de estudioso profundo dos assuntos, documentando-se e preparando as actuações e iniciativas com detalhe e profundidade. Nas situações de gestão, usou a persuasão pela palavra e pelo esclarecimento em detrimento de qualquer forma de autoritarismo.
Em síntese e finalizando, cita-se um excerto dum texto do Professor Jorge Veríssimo[1], Presidente da Escola Superior de Comunicação Social à data do falecimento:
Francisco Costa Pereira foi, acima de tudo, um homem bom! Um homem de valores, extremamente honesto e respeitador, humano e disponível, mas exigente e rigoroso. Estes princípios, valores primeiros da instituição militar, terão sido interiorizados por via da sua formação castrense.
Um amigo, um confidente, um conselheiro, um mentor. Um homem sério e despretensioso, que colocava os interesses institucionais acima de qualquer benefício ou vantagem pessoal. Foi também um intelectual discreto, que não precisava de se colocar em “bicos de pés” para ser ouvido. Era obstinado no seu trabalho, é certo, mas tal conferia-lhe o conhecimento e a legitimidade para se pronunciar, sem receios, nas mais diversas matérias das ciências sociais.
Victor Gonçalves de Brito
[1] Jorge Veríssimo, « Francisco Costa Pereira: um homem bom. Um intelectual. Um amigo, e um mentor (1946-2016) », Comunicação Pública [Online], Vol.11 nº 21 | 2016, posto online no dia 15 dezembro 2016


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